Muitos irmãos
espíritas ainda se assombram quando Espíritos se apresentam em suas reuniões
mediúnicas com trejeitos (ou seja, a maneira de manifestarem-se através dos
médiuns ou a linguagem utilizada) que remetem às incorporações nos milhares de
terreiros de Umbanda e de outras práticas religiosas (como o Catimbó e a
Encantaria), de seus Guias Espirituais e protetores, a qual utilizam uma roupagem
fluídica de acordo com o trabalho que executam e com o público-alvo a que se
destina a sua mensagem, profundamente associada ao imaginário popular e a
cultura brasileira.
Mas por que
tanto assombro? Seria ainda os resquícios do preconceito e do separatismo
religioso? Do racismo? Em pleno Séc. 21 e com todos os avanços sociais
envolvendo a militância negra...
É triste que
a mentalidade do século passado ainda possa perseverar em algumas lideranças e
centros espíritas de que a religião brasileira de Umbanda seria “baixo Espiritismo” ou que sequer seria
uma religião e sim uma seita, como eu
mesmo já tive a infelicidade de ouvir.
Allan Kardec
sempre teve uma postura investigativa e de análise científica, racional, e
graças a essa postura é que codificou a Doutrina dos Espíritos, doutrina que,
aliás, ele sempre deixou claro que o Espiritismo
não é uma religião, apesar dos três aspectos com que se apresenta, e que
uma pessoa não precisaria deixar a sua fé e a sua religiosidade para “ser
espírita”¹.
Interessante
que em toda a sua obra não vemos tratar-se de uma doutrina dos “espíritos
espíritas” como insistem em pensar alguns, porque, se a Doutrina é dos
Espíritos, não importa, então, qual a sua forma de apresentação espiritual ou
mesmo a nacionalidade ou a religião que tiveram quando na Terra... Quer dizer, não deveria importar.
Por que então
a maior aceitação se o espírito for um médico italiano ou padre português? (Se
comparando a espíritos de baianos, pretos velhos ou pombagiras?)
O Espiritismo
em sua essência é acolhedor a todos os Espíritos verdadeiramente comprometidos
com o Bem, mas isso não significa que o espírita o seja. Assim como o
umbandista também não é. Infelizmente o preconceito e o separatismo ainda
existem muito fortemente na mentalidade coletiva dos religiosos...
Obviamente
que a culpa não é do Espiritismo ou da Umbanda, mas do próprio homem com os
seus preconceitos...
Se o
Espiritismo se estabelece em terras brasileiras (cujo povo, inicialmente, eram
as inúmeras tribos indígenas, e posteriormente, com a invasão-colonização
portuguesa e os milhares de negros escravizados trazidos para esta terra) como
então ignorar as suas raízes históricas e culturais? Como ignorar os Espíritos
que fizeram parte da sua formação? Como querer ou achar que os espíritos que se
manifestam nos centros espíritas sejam todos brancos, no padrão europeu?
É claro que
muitos médiuns clarividentes e videntes ignoram, deliberadamente, a presença de
muitos espíritos “de Umbanda” nas sessões mediúnicas espíritas...
É muito
triste tudo isso, essa persistência na ignorância com que alguns espíritas,
deliberadamente, querem permanecer, mesmo com toda a literatura espírita e
umbandista disponível e que muito esclarece sobre a religião umbandista, seus
fundamentos, etc.
A
contribuição dos Espíritos ditos “de Umbanda” é valorosa nas reuniões
mediúnicas espíritas e apométricas. Nos
livros de André Luiz se esclarece quanto à especialização do espírito, o que muitos espíritas parecem não ter lido
(ou fingem ter esquecido)... Se um espírito tem a especialização para lidar com
a energia curativa das forças naturais (das ervas, por exemplo), naturalmente
comparecerá em um trabalho de cura espírita... Se um espírito teve a
especialização, quando na vida material e além dela, em lidar e conter marginais,
é de se esperar que possa colaborar, nas instituições espíritas, em sua guarda
espiritual, impedindo a intervenção de espíritos vândalos e renitentes no mal...
Se um espírito tem profundo conhecimento de psicologia, em sintonia com o Bem,
terá a especialização necessária para atuar nos trabalhos de desobsessão e
conversa fraterna das reuniões espíritas... Seja um médico chinês ou preto
velho... Um soldado romano ou um exu... Uma psicóloga ou uma pombagira...
O Espírito
quando desprendido da matéria entende que sua forma de apresentação espiritual
é relevante apenas ao trabalho que tem a executar e é por isso que vemos
espíritos que se apresentam como frades, padres, orientadores espirituais,
médicos, freiras, etc., se apresentando, também, nas casas, templos e terreiros
de Umbanda com a roupagem fluídica que lhes permita acesso aos corações que ali
comparecem. Isso sem contar que podem, de fato, ter tido as encarnações como
indígenas ou negros escravizados, assim como podem, também, apresentar-se
assim, moldando essa forma astral para trabalhar com os irmãos que procuram a
Umbanda, seguindo o “arquétipo” já consagrado dessas entidades.
A forma não é
mais importante do que a mensagem e infelizmente muitos espíritas (e também
umbandistas, é claro!) ainda erram nesse quesito, porque é certo que não
podemos confiar em um espírito apenas porque se apresenta desta ou daquela
maneira... Tem que se analisar o seu teor energético e os ensinamentos,
mensagens, que transmite.
Ciência Espírita se faz com questionamento e com análise,
com uma postura investigativa, séria e compromissada, como a adotada por Kardec
nas suas investigações no Séc. 18.
Sem isso para
onde está caminhando o Espiritismo? Para uma fé cega? Para um engessamento
doutrinário e teológico à maneira de muitos protestantes que não admitem nada
além da Bíblia? Seria esse o triste futuro dos livros de Kardec, de Chico
Xavier e outros autores espíritas? Será que os Espíritos já passaram tudo o que
tinham para passar através desses livros mediúnicos? NÃO, é lógico que não.
Isso porque a
Doutrina Espírita tem como caráter
principal o progresso², segundo seu próprio Codificador... O progresso é
uma lei divina a qual nada pode fugir.
Por que então
o receio da manifestação dessas entidades nas lides espíritas? Preconceito?
Racismo? Purismo?
Se o mundo material
é plural e o mundo espiritual é o original, verdadeiro, sabe-se, portanto, que
o plano espiritual é igualmente plural e cheio de diversidade...
Por que então
persistir com tanto preconceito?
Fica a
reflexão.
Eloy Augusto.
SP.
25/05/2018.
¹Livro O que é o Espiritismo. Cap. 1, Terceiro
Diálogo. Kardec diz “o Espiritismo era apenas uma doutrina filosófica. Foi a
Igreja que lhe avultou as proporções, apresentando-o como um inimigo terrífico.
Foi ela, enfim, quem o proclamou uma nova religião (...) Seu verdadeiramente
caráter é, pois, o de uma ciência e não de uma religião. A prova disso é que
conta entre seus adeptos homens de todas as crenças e que não renunciaram às
suas convicções: católicos fervorosos, protestantes, muçulmanos, budistas,
brâmanes”;
²Livro A
Gênese. Caráter da Revelação Espírita: “a Doutrina não foi ditada completa, nem
imposta à crença cega, porque é deduzida, pelo trabalho do homem, da observação
dos fatos que os Espíritos lhe põem sob os olhos e das instruções que lhe dão,
instruções que o homem estuda, comenta, compara, a fim de tirar ele próprio as
ilações e aplicações. Numa palavra, o que caracteriza a revelação espírita é o
ser divina a sua origem e da iniciativa dos Espíritos, sendo a sua elaboração
fruto do trabalho do homem” e itens 798 a 802 de O Livro dos Espíritos.
Maravilhoso texto, os os espíritas infelizmente não aceitam nossos antepassados, na minha opinião por puro preconceito, racismo.Continue postando e esclarecendo as pessoas que te seguem.
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